25 junho 2008

Empreendedorismo na China - do Estatal ao negócio próprio de milhões

Por décadas, os estudantes universitários chineses acalentaram o sonho de trabalhar numa estatal e garantir a segurança da família. Hoje, eles querem ter um negócio e ficar milionários

Yin Mingshan, dono de um dos maiores grupos privados da China: da pobreza absolutaa um faturamento de 1,6 bilhão de dólares

O empresário Yin Mingshan, dono de um dos maiores grupos privados da China, cresceu num país onde cultivar tendências capitalistas era crime punido com prisão. Tornou-se um fora-da-lei aos 13 anos, quando tomou 50 centavos emprestados, comprou um punhado de agulhas e passou a vendê-las de porta em porta. Sete anos depois, o governo lançou seus tentáculos ideológicos sobre Yin, que foi acusado de trair a pátria, julgado e preso — condenado a passar o resto da vida nos campos de reeducação criados por Mao Tsé-tung para desvirtuados como ele. Ficou na cadeia durante as duas décadas em que os desvarios maoístas atingiram seu apogeu. Em 1979, foi avisado de que sua prisão havia sido apenas um mal-entendido. Estava livre. “Somente nesse dia vi que poderia voltar a ser uma pessoa normal”, disse Yin a EXAME na sede do grupo Lifan, hoje um dos maiores fabricantes de motocicletas da China.

Trinta anos depois, as histórias dos primeiros empreendedores são repetidas como mitos de formação dessa nova China. Alguns dos mais bem-sucedidos empresários chineses dessa época começaram do zero absoluto, sem dinheiro ou preparo acadêmico. O ex-presidiário Yin Mingshan fundou a Hongda, sua modesta oficina mecânica, em 1992 (o nome não é coincidência). Tinha nove funcionários e começou a se dedicar com afinco à nobre arte da engenharia reversa (desmontar equipamentos para aprender a montá-los). Logo conseguiu produzir cópias das motos japonesas e vendê-las pela metade do preço. Hoje, aos 70 anos, tem 14 000 funcionários, também faz carros e fatura 1,6 bilhão de dólares por ano. Outros casos de sucesso a partir do nada são famosos. Li Dongsheng vendia fitas magnéticas num fundo de quintal nos anos 80. Hoje é dono da maior fabricante de TVs do mundo, a TCL.

Quando o professor Robert Barro, de Harvard, afirmou que a China era o país mais capitalista do mundo, estava evidentemente fazendo uma provocação. Afinal, o país está muito longe de ter instituições sólidas ou um mercado financeiro sofisticado. Mas quem visita a China hoje vislumbra o fundo de verdade dessa frase. Os chineses estão desesperados para aproveitar a onda de crescimento que transformou o país nos últimos 25 anos. Mais de 400 milhões de chineses deixaram a miséria no período. E essa onda de geração de fartura deu origem a uma classe social que não existia antes: os milionários.

Esse estado mental causou uma mudança na forma com que os chineses encaram o risco. Até os anos 90, os estudantes universitários acalentavam o modesto sonho de trabalhar numa estatal, ter estabilidade e garantir a segurança da família. A enxurrada de exemplos de empreendedores e os anos de crescimento, porém, incendiaram a juventude chinesa, que passou a nutrir sonhos mais ambiciosos. Como os séculos mostram, no capitalismo ganha mais quem arrisca mais — e os chineses, agora, estão dispostos a tentar. “Se camponeses sem instrução alguma conseguiram, minha geração tem obrigação de fazer melhor”, diz Lan Haiwen, um xangainês de 35 anos e dono de três diplomas universitários. Ele largou o emprego de vice-presidente de uma multinacional para arriscar tudo numa produtora de games. Faliu e perdeu o que tinha. Na segunda tentativa, as coisas começaram a melhorar.

Essa atitude é movida também por um imenso otimismo em relação ao futuro. Há, na China, a percepção de que se vive uma era de oportunidades única: é a hora, portanto, de apostar alto.

Fonte: adaptado de Exame

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